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Macunaíma e os deputados. Por Dr. Nilton Kasctin Dos Santos (Promotor de Justiça e Professor)
Por Rádio JB
Publicado em 30/06/2025 14:18
Opinião
Imagem: Google IA

“Muita saúva e pouca saúde, os males do Brasil são”, dizia o personagem do livro Macunaíma, de Mário de Andrade. A frase célebre foi cunhada pelo nosso “herói sem nenhum caráter” (apelido que Macunaíma recebeu dos críticos de literatura) para resumir a situação cultural vivida no Brasil de sua época.

         Mas a obra Macunaíma tem também muito a ver com a situação política da época, quando havia uma grande tensão entre a oligarquia cafeeira nacional e a nova burguesia industrial.

         Pois bem. Saúva já não é nenhum mal; as pobres das formigas estão praticamente extintas por causa dos agrotóxicos. A saúde, claro, continua sendo um grande problema.

         Andava eu refletindo sobre essas coisas, eis que encontro Macunaíma. O próprio. Cabisbaixo e pensativo. De supetão pergunto sua opinião sobre o Brasil de hoje. E ele me sai com essa:

         - Muito deputado e pouca educação, os males do Brasil são.

         - Bravo! – exclamo. - Como não havia pensado nisso antes?!

Numa curta prosa, Macunaíma me conta que já nem consegue brincar direito. De tristeza por estar a cada dia mais difícil encontrar a muiraquitã.

         É muito deputado mesmo. E muito senador. São mais de 600 deles, nababescamente desfalcando o minguado dinheirinho dos nossos impostos. Do nosso trabalho suado e honesto.

         E agora estão aprovando em Brasília uma lei que altera o número de deputados. Para diminuir? Não. Para aumentar! De 513 para 531. Nem falei ainda com Macunaíma sobre isso. Mas certamente nosso herói anda arrasado com essa falta de vergonha. E revoltado.

         Esse monte de deputados e senadores está lá para fazer leis. Mas não precisamos de leis novas. Por cem anos. Explico: se o Congresso ficar cem anos sem fazer uma única lei, ninguém vai notar. Já temos milhares delas, que tratam de tudo. Do passado, do presente e do futuro.

         O orçamento do município de Catuípe para 2025 é de 56 milhões. Para todas as secretarias, com suas obras, folhas de pagamentos, programas sociais, investimentos em infraestrutura e muito mais. O gasto com a atuação desses novos deputados federais, segundo divulgado na imprensa, também custará em torno desse montante em apenas um ano, somando mais de 150 milhões só com essas novas vagas, durante a legislatura de quatro anos. Dá para termos uma ideia de quanto imposto teremos que pagar a mais para custear essas novas vagas de deputado.

         O gasto de bilhões do Congresso (Câmara e Senado) é superior às despesas da maioria dos ministérios do Executivo Federal.

         Com 56 milhões por ano, Catuípe administra bem uma comunidade de 10 mil habitantes; no mesmo período, a Câmara gastará mais do que isso para sustentar essas 18 novas cadeiras de deputado federal.

         Faltam professores, policiais, servidores da Emater, bombeiros, fiscais do Ibama, servidores do INSS e do SUS etc. Em todo o Brasil. Mas lá na Câmara e no Senado não tem nenhuma vaga sobrando. Nem de deputado e senador, nem de servidores. Onde os salários são os mais altos do País.

         Por quê? Isso os eleitores devem perguntar a Macunaíma. Melhor diretamente aos parlamentares.

         Mas Macunaíma não tem esperança que os eleitores questionem os deputados e senadores.

         Porque o nosso sistema educacional ruiu completamente. No Brasil não se educa para formar pessoas comprometidas com a vida em sociedade, muito menos para desenvolver a capacidade de refletir, pensar e criticar; educa-se unicamente para formar um profissional de qualquer coisa para o mercado, com o fim exclusivo de ganhar dinheiro.

         Fruto disso, temos uma sociedade politicamente analfabeta, corruptível e egoísta.

         Muito deputado. Pouca educação. - Mas qual a solução, mestre Macunaíma?

         - Diminuir para 120 deputados e 12 senadores, cada um com apenas um assessor e dois estagiários. E nada de verba de gabinete, cotas e emendas parlamentares – sentencia convicto nosso herói.

         - E um orçamento anual de cem milhões. O resto vai para a educação – completa Macunaíma, que fala exatamente o que penso.

Por Dr. Nilton Kasctin Dos Santos (Promotor de Justiça e Professor)

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