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A dádiva da doação. Por Dr. Nilton Kasctin Dos Santos (Promotor de Justiça e Professor)
Por Rádio JB
Publicado em 20/06/2025 17:20
Opinião

Não repartir a riqueza com os pobres é roubá-los, escreveu o bispo São João Crisóstomo, em seu livro “A riqueza e a Pobreza”, publicado no século quarto, portanto há mais de 1600 anos.

         Esse livro foi reeditado recentemente, com prefácio de Eduardo Moreira, Leonardo Boff e do padre Júlio Lancellotti. De leitura imperdível, está à venda pela internet.

         Crisóstomo, que em grego significa “Boca de ouro”, foi o apelido que o povo deu a esse Bispo católico pelos sermões contundentes que fazia em favor dos pobres e contra a ganância dos abastados. Alguns desses sermões estão no livro. E nem seria preciso esclarecer que o conteúdo de suas mensagens pregadas provocou a fúria dos governantes e ricaços da época, o que levou o pregador à prisão, e depois ao exílio, onde morreu.

         Antes de qualquer mal entendido, vou explicando que não estou nem insinuando que devemos repartir com os pobres tudo o que temos de bens materiais. Nem era essa a ideia do santo Crisóstomo. Estou falando de doação, que significa simplesmente a essência do cristianismo. Em outras palavras, uma pessoa que não gosta de doar, está longe de praticar o cristianismo.

         Um cristão praticante precisa viver uma verdadeira cultura da doação. Pode ser doação em prol de uma causa específica, ou de todas as causas que possam representar uma possibilidade de mudar o mundo para melhor. O que devemos doar? Nosso tempo, nosso conhecimento, nossos talentos, e até mesmo nossa fé quando intercedemos por alguém com nossas preces. Mas, principalmente e acima de tudo, quem vive em um regime capitalista, como nós, precisa doar uma parte do seu dinheiro.

         Madre Tereza dizia: “Quem não vive para servir, não serve para viver”. Essa frase parece radical demais para uma santa. Mas sintetiza com precisão a essência da doação. Servir é praticar alguma ação em favor do outro. É doar. E como existem formas de servir!

         Mas vamos falar da forma mais fácil de servir, que é doando uma parte do nosso dinheiro. Mesmo que seja bem pouquinho. E isso vai resolver os problemas financeiros dos pobres? Não. Doação não tem essa finalidade; doação é uma forma de manifestar nossa humanidade, nossa compaixão, nossa comunhão com Deus, nossa gratidão pela vida, nosso amor ao próximo, nosso estado de alegria interior.

         A doação está alicerçada em quatro princípios: compaixão, gratidão, retribuição e desinteresse material.

         Compaixão significa colocar-se no lugar daquele que sofre. É sofrer com o que sofre. Mas quando doamos a uma pessoa necessitada, não estamos apenas fazendo um bem para o destinatário da nossa ação; estamos também praticando algo em nosso próprio benefício, mesmo sem perceber. Está escrito na Bíblia, no Salmo 41: “Bem aventurado é aquele que se compadece do necessitado, pois o Senhor o livrará no dia do mal. O Senhor o protegerá e preservará a sua vida. Ele o fará feliz na terra”.

         Que promessa maravilhosa! Sabemos que o mal sempre nos rodeia. A todo instante estamos sujeitos ao mal. E não sabemos o dia, nem a hora em que o mal virá nos assaltar. Mas o Salmista, do alto de sua espiritualidade e experiência de comunhão com Deus, nos ensina uma forma de vivermos debaixo da proteção divina e assim escapar das ciladas do maligno: ter compaixão dos que sofrem. Colocar-se no lugar do necessitado. Doar.

         E a essa promessa de proteção divina contra o mal ainda vem cumulada da garantia de sermos felizes. “O Senhor o fará feliz na terra”. E tem coisa melhor do que viver feliz? Confesso que sinto imensa alegria quando posso doar alguma coisa. Sempre dou uma gorjeta para a pessoa que calibra os pneus e passa uma água nos vidros do meu carro, para o que carrega um saco de ração ou as mercadorias do supermercado para mim. Também sou doador para a igreja e para ONGs que cuidam dos animais. E quando compro alguma coisa de um pobre, sempre pago um pouco mais do que ele pede, jamais uso de pechincha quando o vendedor é pobre. Meus pais faziam assim.  Mas o que me deixa feliz de verdade é poder ajudar quem realmente está necessitando, quem está passando por uma dificuldade na vida (continua em edição posterior).

Por Dr. Nilton Kasctin Dos Santos (Promotor de Justiça e Professor)

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